Sobretudo: o dizer!

05 | 09 | 2024
Angelo Luiz Ferro
Angelo Luiz Ferro
Qual a responsabilidade social que cada sujeito presente na sociedade tem acerca de questões sobre o suicídio, e de que modo refletir sobre possibilidades de enfrentamento?Dedicar um mês para falar sobre a prevenção ao suicídio é um grande avanço, mas precisamos avançar mais. Deve-se estender para todos os meses do ano, uma vez que é uma questão de saúde pública, no Brasil – segundo dados entre os anos de 2000 e 2019, o suicídio subiu cerca de 43% -. No campo da psicologia, entendemos que é um fenômeno complexo e multicausal que tem impacto tanto individual quanto coletivo, uma vez que toca a todos em algum grau, afetando pessoas das mais diversas origens, gêneros, culturas, classes sociais e idades. Assim, relacionado com uma ampla gama de fatores, que incluem aspectos sociológicos, econômicos, políticos, culturais, psicológicos e psicopatológicos.Os avanços da neurociência cada vez mais nos ajudam a explicar o funcionamento da psique humana, mas devem somar-se à visão de sujeito a partir da sua profunda compreensão sociocultural e psicológica, isto é, o sujeito deve ser analisado em toda sua complexidade, e não de maneira psicologizante e reducionista. Dito de outro modo, é poder constatar que a tentativa de suicídio quase nunca tem por finalidade a morte do próprio sujeito, pode-se querer extinguir um sofrimento e que, ao fazê-lo, extingue-se também, mas não o fim por ele mesmo. O profissional de psicologia deve ir além das motivações aparentes do ato, deve investigar os mecanismos psíquicos e conflitos não conscientes envolvidos e que se tornaram sintomas.Desta feita, o ato suicida demonstra uma grande ambivalência, no qual o sujeito persegue a morte, mas de alguma maneira deseja a intervenção de socorro, quando transmite sinais verbais ou comportamentais da sua intenção. É como se ele quisesse comunicar que algo está errado e necessita de uma solução, mas não encontra meios para fazê-lo. Talvez a poetisa Ana Cristina Cesar tentou sintetizar o que está elucidado acima, ao propor que a “angústia é fala entupida”.Por isso o suicídio – ou a tentativa – também é considerado um pedido de ajuda: bem no âmago, a vida está presente buscando meios de emergir.Refletir sobre o tema à luz dos pressupostos psicanalíticos envolve reconhecer que a psicanálise foca na singularidade do sujeito e em seu sofrimento de maneira ímpar partindo do pressuposto que antes de categorizar o sofrimento, é necessário ouvir o sujeito, dar estatuto de verdade para sua dor e explorar os significados e sentidos que permeiam seu psiquismo.Devemos confiar no ato analítico e na condução do tratamento como opositor ao ato suicida. Ou seja, o psicólogo – através de sua sólida formação e conduta ética - deve conclamar que o sujeito pense que esse ato pode esperar por uma análise, a começar pela pulsão de vida, para que o paciente abra mão da satisfação com a morte e possa substituí-la pelo desejo de viver, de saber e de seguir, mas sobretudo de dizer sobre seu sofrimento a fim de ressignifica-lo.

opinião.